sábado, 7 de junho de 2014

Você conhece a história do Acompanhamento Terapêutico? A quem se destina este tipo de atendimento?


Em um de meus textos publicado aqui, escrevi sobre o personagem Adrian Monk que sofre com o Transtorno obsessivo-compulsivo (TOC) e mencionei que ele tem a ajuda de uma enfermeira, que faz o trabalho de AT (acompanhamento terapêutico). Com esta ajuda Adrian Monk volta à vida. Mas o que é um AT? Como ele surgiu? A quem se destina este tipo de atendimento?



O Acompanhante Terapêutico (AT) é um profissional qualificado para intervir no ambiente do cliente, buscando proporcionar uma melhor qualidade de vida.

O Acompanhamento Terapêutico oferece um atendimento diferenciado, pois trabalha no local em que as contingências se estabelecem, onde o cliente estabelece relações com o meio.

Historicamente o trabalho de AT era voltado somente à área dos transtornos psiquiátricos (Barreto, 1998), mas sabemos que este tipo de atendimento está em constante crescimento e aprimoramento; que seu trabalho diz respeito a um auxílio em tempo real, o AT está com o cliente ali, no seu dia a dia, fazendo as atividades em conjunto (o que significa que o trabalho do AT não é só o de escuta do discurso, é o de fazer), sendo assim o trabalho de AT tem se estendido para outros campos, como deficiência mental, deficiência física, dependentes químicos (álcool e outras drogas), intervenções cirúrgicas e pacientes psiquiátrico.

Com ajuda do AT, o cliente é encorajado a iniciar um contato com o mundo, fazer amigos, participar de atividades sociais. A prática do AT é uma atividade que pode propiciar maior mobilidade, uma aproximação do universo do cliente com o das demais pessoas.
Essa prática pretende oferecer ao indivíduo a possibilidade de transitar por diferentes dimensões da vida, em um movimento de transformação e crescimento.

Como surgiu o AT?
Em meados de 1960, na Europa, iniciava-se um movimento psiquiátrico que visava humanizar os tratamentos de pacientes considerados doentes mentais e que estavam asilados da sociedade. Esse movimento foi marcado por mudanças de paradigma. Passou-se a considerar que o “isolamento” de um paciente em um hospital psiquiátrico seria prejudicial ao seu tratamento, favorecendo assim, a cronicidade dos efeitos impostos pela doença mental (Chaim, 1999).
Alguns psiquiatras da época defendiam que a reinserção social do paciente psiquiátrico seria o propulsor da melhora do indivíduo com sofrimento psíquico. Acreditavam, contrapondo-se a outros movimentos psiquiátricos de sua época, que o ser humano deveria ser considerado em sua totalidade biopsicossocial (Chaim, 1999).
Foi então que em alguns países, em especial na Inglaterra, com Laing e Cooper, e na Itália, com Basaglia, iniciaram-se os trabalhos de desospitalização, com a ajuda de técnicos que se instrumentalizaram para “acompanhar” os pacientes em sua “reintegração social, ou em sua adaptação enquanto indivíduos cidadãos”(Chaim, 1999).
Devido à mudança de paradigma no tratamento de pacientes psiquiátricos na América Latina, especialmente na Argentina em meados de 1970, o psiquiatra, Eduardo Kalina introduziu uma nova modalidade de atendimento em saúde mental: o acompanhamento terapêutico (AT). Inicialmente o profissional que desenvolvia o AT era dominado “amigo qualificado”. O termo amigo deixou de ser usado por não corresponder à amplitude assumida pelo papel do AT (Kalina, 1998).
Assim como na Argentina, esse movimento apareceu no Brasil, por volta da década de 70, percorrendo dois trajetos: primeiro passa por Porto Alegre e chega ao Rio de Janeiro, sendo conduzido por Carmem Dametto. No segundo momento, chega a São Paulo na companhia da psicanalista argentina Beatriz Aguirre, uma das fundadoras do Instituto “A Casa” em 1979 (Barreto, 1998).
Carmem Dametto já trabalhava como auxiliar psiquiátrica na clínica Pinel, em Porto Alegre. Em 1969, é chamada para trabalhar na clínica Vila Pinheiros, no Rio de Janeiro; cria nessa comunidade uma equipe de auxiliares psiquiátrico que posteriormente, tornam-se ATs no Rio de Janeiro.
Mesmo quando ocorreu o fechamento dessas comunidades, os “auxiliares psiquiátricos” como eram chamados no Brasil, ainda eram solicitados por terapeutas e familiares para evitar a internação (Barreto, 1998).
Com a efetivação deste trabalho, o serviço passou a ser chamado de “Acompanhamento psicoterapêutico”.
Barretto (1998) esclarece que essa atividade era exercida por estudantes de psicologia, de ciências sociais e de medicina. Com o passar do tempo, o AT foi se constituindo como um recurso a mais no tratamento de pacientes psicóticos e devido à gravidade dos casos observou-se que as psicoterapias individuais, grupais e tradicionais, além de remédios, não eram suficientes. Como a atividade do AT foi sendo cada vez mais solicitada, houve então uma especialização do profissional, e muitos outros profissionais puderam atuar como acompanhantes.
Ainda hoje um estudante realiza esse auxílio psiquiátrico. Muitas vezes, acompanha o cliente em seu cotidiano desde o seu despertar até a última hora de seu dia. O graduando, não pode decidir quais técnicas utilizar, uma vez que faz parte de uma equipe. No caso de atuar sozinho, suas decisões são subordinadas ao profissional que o contratou (Zamignani, 1999). Por outro lado, o AT, deve ter autonomia para tomar decisões em situações inesperadas, deve estabelecer uma relação empática e um bom vínculo com seu cliente e estar atento para não se colocar no papel de amigo, evitando respostas emocionais que podem ser facilitadas por se tratar de um trabalho no ambiente natural do paciente. Sendo assim, é de suma importância que o AT tenha uma formação acadêmica especializada na área e supervisões frequentes (Vianna & Ignácio, 2006).

A quem se destina esse tipo de atendimento?
O trabalho do AT é uma prática nova no campo da saúde metal. No que se refere aos profissionais da área comportamental, a demanda surge de psiquiatras que procuram esta abordagem voltada ao trabalho de transtornos psiquiátricos (Zamignani, 1997).
Já tive a oportunidade de entrevistar alguns ATs e observei que muitos deles são solicitados para trabalhar com clientes diagnosticados com algum transtorno fóbico. Esses ATs ajudam o cliente, através de uma análise das contingências que mantêm o comportamento “problema”, ajudam a rearranjar essas contingências de maneira que comportamentos incompatíveis sejam reforçados positivamente e naturalmente (evitando o reforçamento negativo e arbitrário). O acompanhante terapêutico pode ser visto então como “um arranjador de contingências de reforço e dispensador de reforço positivo” (Savoia & Sampaio, 2010).
Outros se utilizam de técnicas como exposição, dessensibilização sistemática, treino de respiração e relaxamento. Além disso, é empregada a psicoeducação junto à família, a qual também se beneficia deste tipo de atendimento.
O AT é indicado para qualquer faixa etária, assim como para atender pacientes pré e pós-cirúrgicos, sindrômicos, com desenvolvimento atípico, dependentes químicos, pacientes psiquiátricos, terceira idade, depressivos (pós-parto, luto e separações), pacientes terminais, casos em que o cliente se recusa a frequentar o consultório ou esta frequência é contraindicada (Zamignani, 1997).





Referências 


Barretto, K. D. (1998). Ética e técnicas no acompanhamento terapêutico: andanças com Dom Quixote e Sancho Pança. São Paulo, Unimarco.

Chaim, A. (1999). Projeto de acompanhamento terapêutico em grupo - Um breve histórico. Disponível em: http://siteat.net/2002/06/20/denis/ Equipe de acompanhamento terapêutico do 

Hospital Dia “A Casa” (1991). A rua como espaço clínico. São Paulo, Escuta.

Equipe de acompanhamento terapêutico, Instituto “A Casa” (1997). Crise e cidade: acompanhamento terapêutico. São Paulo, EDUC.

Kalina, E. (1998). Tratamento de adolescentes psicóticos. Rio de Janeiro: Francisco Alves.

Vianna, A. M., & Ignácio, C. V. (2006). Acompanhamento terapêutico. Em: M. G. Savoia (Org.). A Interface entre Psicologia e Psiquiatria – novo conceito em saúde mental. São Paulo: Roca. 

Zamignani, D. R. (1997). O trabalho de acompanhamento terapêutico: a prática de um analista do comportamento. Revista Biociências (Taubaté), vol.3, n(1), pp. 77-90.

Zamignani, D. R. (1999). Qual o lugar do AT numa equipe multidisciplinar? Em: R. R. Kerbauy & R. C. Wielenska (Orgs.). Sobre comportamento e cognição. Vol. 4, pp. 166-176. Santo André: Arbytes.

Savoia, M. G., & Sampaio, T. P. A. (2010). Técnicas cognitivo-comportamentais: considerações sobre o repertório do AT. Em: I. Londero (Org.) Acompanhamento Terapêutico: Teoria e Técnica na Terapia Comportamental e Cognitivo - comportamental. (pp. 37-49). São Paulo: Santos.

 



 

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